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Os dilemas do conflito Hamas-Israel com o fim do cessar-fogo

Os dias de pausa nos combates na Faixa de Gaza — originalmente eram quatro, depois foram expandidos para seis — permitiram pela primeira vez ter alguma perspectiva de fim para o conflito iniciado pelos ataques do Hamas em 7 de outubro, que deixou 1,2 mil mortos em Israel e 15 mil no território palestino. Ao mesmo tempo, os envolvidos na guerra, Israel, Hamas, Autoridade Nacional Palestina e governos de outros países, estão diante de dilemas de difícil resolução.

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A curto prazo, a trégua é positiva para todos. Dezenas de reféns capturados pelo Hamas já estão com suas famílias, recebendo tratamento e planejando a retomada de suas vidas. Palestinos presos em cadeias israelenses, muitas vezes sem uma acusação formal, voltaram para casa na Cisjordânia.

Para a população de Gaza, especialmente do Norte, foi a chance de receberem ajuda humanitária depois de semanas. E ao redor do mundo, o cessar-fogo foi celebrado por governos, lideranças políticas e organizações internacionais. Em discurso, o secretário-geral da ONU, António Guterres, afirmou que era um “lampejo de esperança em meio à escuridão da guerra”.

E até quando vai durar essa pausa nos combates? Nesta terça-feira (28), autoridades israelenses traçaram um “limite” às extensões de cessar-fogo: dez dias, e o premier Benjamin Netanyahu afirmou, no domingo, que assim que a trégua terminar, retomará a operação militar com força total, reiterando a promessa de acabar com o Hamas e libertar os reféns.

Mas desde o início da guerra, Israel não foi capaz de demonstrar que as semanas de bombardeios, combates terrestres e anúncios de mortes de comandantes do Hamas foram capazes de debilitar a capacidade do grupo de realizar ataques como os de 7 de outubro no futuro.

A rede de túneis, apontada como centro nervoso da organização, aparentemente segue operando, segundo relatos de alguns dos reféns libertados. Na segunda-feira, o Canal 12 de Israel revelou que o líder do Hamas, Yahya Sinwar, se encontrou com alguns dos israelenses no cativeiro. E a própria trégua, por mais que tenha permitido a troca de reféns e entrega de ajuda, também deu tempo para o Hamas se reagrupar.

Neste contexto, pela perspectiva israelense, se Netanyahu aceitar um cessar-fogo mais longo do que o atual ou então permanente, estaria praticamente assinando uma carta de capitulação. O Hamas, por maior que seja a destruição em Gaza, seguiria no controle do território, e agora conta com um apoio crescente na Cisjordânia.

Bandeiras do grupo foram vistas em Nablus e Beitunia para recepcionar os prisioneiros libertados, e uma pesquisa divulgada na semana passada mostrou que três quartos dos palestinos em Gaza e na Cisjordânia apoiam, em diferentes graus, os ataques de 7 de outubro.

Em artigo publicado no Haaretz, o colunista Anshal Pfeffer faz uma reflexão sobre como poderia ser essa nova etapa da guerra. Para ele, é indispensável centrar as ações também no Sul de Gaza, para onde as lideranças do Hamas, incluindo Yahya Sinwar, parecem ter escapado. Cidades como Khan Younis e Rafah, que receberam milhares de refugiados vindos do Norte, se tornariam alvos mais frequentes dos ataques e de um cerco militar que o analista vê como inevitável se Netanyahu quiser cumprir a “missão” de acabar com o grupo terrorista

Eis que surgem alguns dilemas. A retomada dos ataques significa que novas libertações de reféns estarão fora de cogitação por algum tempo, e a segurança deles estaria comprometida. O diretor regional da Cruz Vermelha, Fabrizio Carboni, disse à TV russa RBK que os cativeiros em Gaza estão muito próximos das áreas de combate, situação que ele chamou de “atípica”. As famílias dos sequestrados citam com frequência o risco das bombas matarem, além de terroristas, seus parentes e amigos capturados há mais de 50 dias.

Pelo lado palestino, Pfeffer pontua que Khan Younis e Rafah estão bem mais povoadas do que antes do início da guerra. Bombardeios como os vistos na Cidade de Gaza e no campo de Jabaliya teriam o potencial de causar um número bem maior de vítimas civis, elevando a pressão internacional sobre Netanyahu. Hoje, são poucos os líderes ocidentais a defender o fim das hostilidades, como o presidente francês Emmanuel Macron, mas há alguns sinais de mudança no ar.

Os EUA, maiores aliados de Israel, se mantém firmes no apoio à guerra, ao mesmo tempo em que trabalham pela libertação de reféns, pela extensão da atual trégua, ao lado de Egito e Catar (embora Joe Biden queira ampliar o acesso de Israel ao arsenal de guerra americano), e vêm defendendo a solução de dois Estados, um palestino e um israelense.

Existe uma preocupação humanitária legítima, mas ela convive com um cálculo que inclui as eleições do ano que vem: pesquisas mostram que parte dos democratas rejeita a estratégia dos EUA para a guerra, e em estados como o Michigan, setores que sempre votaram com seu partido, como os árabes-americanos, ameaçam lhe dar as costas.

Ainda na política, há o dilema de Benjamin Netanyahu. O mais longevo primeiro-ministro da História do país, que se aliou com os setores mais radicais do país para voltar ao poder, se viu mais uma vez conduzindo Israel em uma guerra. Mas o conflito iniciado em outubro era diferente: o Hamas aproveitou a maior falha de segurança já vista na região para assassinar, estuprar e sequestrar mais de 1,5 mil israelenses, causando um trauma coletivo que levará décadas para começar ser curado.

Ao contrário de líderes em tempos de guerra, Netanyahu perdeu popularidade: uma pesquisa do jornal Maariv, feita entre os dias 15 e 16 de novembro, mostrou que seu partido, o Likud, seria esmagado caso houvesse uma eleição agora. 52% dos entrevistados disseram preferir que Benny Gantz, rival de Netanyahu em eleições no passado, comande o país (contra 27% que defendem o atual premier).

Por isso, mais do que uma guerra para destruir um inimigo, o conflito também pode ser a última chance que Netenahyahu tem de salvar sua vida política. Antes do 7 de outubro, ele já estava sob intensa pressão das ruas por causa de seu projeto de reforma judicial, comparada a um golpe por oposicionistas — agora, não são poucos os que questionam a capacidade dele de liderar o país em um dos momentos mais complexos e odas últimas sete décadas. Um quadro que talvez nem uma vitória contundente em Gaza possa mudar.

“A conclusão é de que o governo Netanyahu está causando graves danos à posição estratégica de Israel, e levando a uma guerra que não tem fim”, escreveu, em artigo no Haaretz, o ex-premier Ehud Barak (1999 a 2001). “O governo de Netanyahu precisa acabar antes que as consequências desses erros se tornem irreversíveis.”

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